Estamos no início de março de 2022, passaram duas semanas desde que começou a invasão russa à Ucrânia. Todos os meios noticiosos afirmam que “O mundo está a assistir”, e na verdade, para boa parte do mundo, é tudo o que podemos fazer.
Chaga-nos de repente o choque de uma guerra em solo europeu, relembrando as tragédias da década de 90 nos Balcãs ou da Segunda Guerra Mundial.
Para muitos, esta é uma oportunidade para sinalizar valores, reagir simbolicamente ou com substância. Todos entendemos que estes tempos carregados de emoção impactam as associações às marcas dos países, as nossas perceções dos lugares e as nossas respostas enquanto “consumidores”.
O espírito europeísta é frequentemente elogiado como a razão que sustenta a influência da Europa no mundo, e é entendido pelos valores políticos, económicos e sociais partilhados pelos europeus. Estes valores moldam as respostas a problemas e (supostamente) diferenciam a Europa – ou sua Marca “Região” – do resto do mundo.
A invasão russa à Ucrânia coloca em cheque o próprio significado do europeísmo e se tal conceito consegue resistir às divisões e polaridades que emergem por não conseguir continuar a partilhar estas valores base. Eles reestruturam a nossa compreensão da dicotomia Este-Oeste, embora a questão também deva ser se a divisão é binária.
Quando esta crise esbater e as armas forem depostas, podemos esperar que a Rússia reinicie um moroso processo de reposicionamento no mundo. O mesmo não se aplicará à Ucrânia.
Para o mundo, e até para a Europa, a Ucrânia enquanto País e Nação era maioritariamente desconhecida. No dia 24 de Fevereiro de 2022, tudo mudou. Ao longo destes dias fomos testemunhando histórias de resiliência, bravura e determinação incomparáveis.
“De repente, no meio desta desgraça e sem saber, a Ucrânia construiu uma Marca Nação, tanto e tão forte que os atributos que ela representa e pelos quais é conhecida hoje posicionam-na como uma marca que a Europa quer, ou melhor, que a Europa precisa. É assim que a Marca de uma Nação é construída.”
Branding de um território pós-conflito
Países, regiões e cidades com economias estáveis e em tempos de paz, tanto quanto aqueles que passam por mudanças trémulas, estão de igual forma em constante adaptação e a gerir a sua reputação internacional. No entanto, o Nation Branding e o City Branding vão muito para além da promoção, das relações-públicas, da negociação de identidades. São processos complexos que passam por infraestruturas e as suas deficiências, heróis nacionais ou reservas de petróleo, a hospitalidade das pessoas ou o património medieval existente. A Marca de cada País engloba um conjunto de associações, com uma relação indiscutivelmente recíproca com a reputação e a perceção deste.
A Europa enquanto Marca Territorial ganhou propósito, tração e coesão, não por virtude, mas por necessidade. A Marca País da Ucrânia foi construída numa semana, enquanto, infelizmente, a Marca País da Rússia foi quase destruída num dia (o tempo o dirá) – tudo pelas piores razões possíveis.
Todos temos noção que um possível envolvimento militar dos países europeus e do resto do mundo neste conflito acarreta incalculáveis perigos. No entanto, como será que a falta de medidas ou de ações rápidas e adequadas poderá afetar as imagens que vamos construindo diariamente sobre os Países – estas mesmas imagens orgânicas podem ser um ativo ou um peso para as iniciativas estratégicas das Marcas País?
O que é que isto significará para a Ucrânia e para a Rússia? As principais estratégias de Branding geralmente ficam aquém quando implementadas num ambiente pós-conflito. Este ambiente está carregado de emoções, é tempo de lamber as feridas, contar as vítimas, construir abrigos.
No meio do caos, um ambiente pós-conflito precisa renegociar um sentimento de pertença com seus habitantes, mas também com região. Muitas vezes envolve uma combinação de relações-públicas, diplomacia e sim… estratégias de marketing.
A Rússia precisará repensar sua posição e reputação daqui para frente, se e de que maneira irá reconhecê-la. As suas associações são hoje dominadas pela marca de uma pessoa e as suas ações nos dias seguintes têm uma capacidade sem precedentes de mudar a narrativa. Como é que este conflito irá afetar as perceções do povo russo e como é que eles (re)negociarão a sua relação com o seu país?
Em relação ao resto do mundo, diferentes níveis de envolvimento no conflito ditarão como as nossas perceções mudarão. De qualquer forma, precisamos reconhecer que nossa nova realidade será a de um ambiente (pós)conflito.