Os turistas ficam em casa?

Desde os anos da COVID, muitos comentadores profetizaram uma nova era de “turismo alternativo” para o mundo pós-pandemia, e o “tourism-bashing” tornou-se uma tendência da moda! O over Tourism, o flight-shaming, a turismofobia e o demarketing não pararam de aparecer nos editoriais e nos debates das redes sociais. No centro destas críticas está uma verdade histórica: a indústria do turismo tem sido frequentemente objeto de desdém de classes, com muitos líderes de opinião a olharem para o turismo de massas com um olhar crítico. Consideram-no uma rutura com a sua visão aristocrática das viagens, que deveria ser reservada a alguns privilegiados, supostamente com um comportamento mais virtuoso. Para eles, o turismo – centrado no lazer e no gozo – é visto como frívolo, destrutivo e negligente face aos desafios ambientais e climáticos prementes.

Mantenha a calma e seja um bom turista!

Embora o turismo seja muitas vezes um alvo fácil, não deve ser o bode expiatório de todos os problemas do mundo. O que seria de Versailles, Machu Picchu, Angkor ou Veneza sem o turismo (de massas)? Ruínas prováveis, perdidas para sempre para a humanidade! Graças ao turismo, sítios como Madā’īn Ṣāliḥ em Al-‘Ula, na Arábia Saudita, estão a ser descobertos e apreciados outra vez. E as florestas da Costa Rica, os gorilas do Ruanda ou os dragões de Comodo? São espécies e espaços em risco de extinção que o turismo ajudou a proteger, mostrando a sua beleza e fomentando os esforços de conservação – protegendo-os de forças muito mais destrutivas como a desflorestação, a caça, a urbanização e as alterações climáticas.

Atualmente, em vez de entrarmos em pânico com destinos sobrelotados, podemos ter a certeza de que a mensagem foi ouvida. A pressão turística está a ser tratada através de regulamentação e harmonização, porque “turistas vão para casa” não é uma solução sustentável. Com uma gestão adequada e mudanças de comportamento, as maravilhas do mundo continuarão a encantar-nos. Têm o direito de o fazer, tal como consagrado na Declaração Universal dos Direitos do Homem: O artigo 13º garante o direito de cada um “a sair de qualquer país, incluindo o seu, e a regressar ao seu país”, e o artigo 24º complementa-o afirmando o direito ao “repouso e lazer… e a férias periódicas remuneradas”. Alinhamos com o ponto de vista do sociólogo Jean Viard: “O turismo é um sistema de valores e de ações que permite à humanidade desenvolver uma consciência coletiva para vencer a batalha contra as alterações climáticas”, bem como promover a educação, a cultura, a abertura, a prosperidade e a paz.

Turismo, revelar territórios

Não será então o turismo, mais do que nunca, um dos principais vectores de mudança e de re-encantamento de um novo mundo que está a ser moldado? Defendamos, pois, um desenvolvimento turístico responsável! Mas, antes de mais, temos de chegar a acordo sobre o que significa “desenvolvimento”.

O desenvolvimento do turismo e a sua legitimidade para um país, região ou cidade não podem ser medidos apenas pela sua contribuição para o PIB ou pelo número de visitantes externos, o seu impacto económico ou os empregos criados. Também não se trata apenas de melhorar a qualidade de vida local através de infraestruturas de lazer ou da proteção e valorização do património cultural e natural. Mais importante ainda, o turismo funciona como um poderoso pilar do “soft power” de um território. Revela a essência da identidade e do dinamismo de um lugar através da experiência. Por sua vez, a imagem de marca de um destino influencia outros sectores da economia, promovendo as exportações, atraindo investimentos empresariais e incentivando novos talentos a estudar, trabalhar ou estabelecer-se na região.

Rumo a uma harmonização do turismo

Em vez de nos concentrarmos apenas no desenvolvimento, devemos procurar a harmonização do turismo num território, equilibrando os interesses a curto e a longo prazo dos atores locais: residentes atuais e futuros, visitantes, recursos culturais e naturais e opinião pública global, que vê cada vez mais certos destinos como parte do bem comum, especialmente quando a UNESCO está envolvida.

Um destino harmonizado, a que gostamos de chamar “Loved Destination”, garante que uma estratégia de turismo partilhada se alinha com a Ideia Central e a visão da marca territorial, desenvolvida por e para os seus residentes. Esta abordagem assenta em quatro pilares fundamentais: vontade, emoção, experiência e reconhecimento. Estes são cruciais para promover uma interação holística entre residentes e visitantes antes, durante e depois da sua estadia.

Primeiro vem a vontade – dos residentes em receber (ou não) os visitantes, e do público externo em visitar, regressar ou ficar. Segue-se a emoção provocada pelo encontro entre os valores incorporados pela marca territorial e o imaginário interiorizado do visitante. Esta emoção torna-se realidade quando as experiências turísticas se alinham com a identidade do destino e com as expectativas dos visitantes. Quando esta harmonia é alcançada, o destino ganha o estatuto de “top-of-mind”, tornando-se um local que deixa uma impressão duradoura nos visitantes muito depois de estes regressarem a casa. Em última análise, um “Loved Destination” equilibra a sustentabilidade, a abertura e a sensibilização para garantir que o turismo se desenvolve harmoniosamente ao lado de outros sectores económicos.

Na Bloom Consulting, acreditamos que o desenvolvimento turístico sustentável é um projeto de harmonização – entre os ativos atuais e futuros de um território e os seus residentes, sejam eles permanentes ou temporários. Trata-se de reconciliar o turismo – uma das mais belas indústrias do mundo – com os seus críticos.